Sob a coordenação do Instituto Pró-Livro, foram entrevistadas 5.012 pessoas com cinco anos de idade ou mais, alfabetizadas ou não. A amostra representa 92,3% da população brasileira. Os selecionados responderam por uma hora a um conjunto de 60 perguntas, aplicadas por um pesquisador entre os dias 29 de novembro e 14 de dezembro de 2007. As questões tinham como objetivo diagnosticar e medir o comportamento leitor da população, especialmente com relação aos livros e conhecer a opinião que tem da leitura. Como objetivos secundários, os pesquisadores pretendiam investigar qual a percepção da leitura no imaginário coletivo, definir os perfis do leitor e do não leitor, identificar as preferências do leitor além de avaliar canais e formas de acesso, assim como barreiras que existem para a leitura.
Sob a coordenação de Galeno Amorim, do Observatório do Livro e da Leitura, os resultados obtidos foram avaliados pelos consultores Maria Antonieta Cunha (UFMG), Lucília Garcez (UnB), Felipe Lindoso (Associação Cultural Basílio da Gama - que realiza projetos de incentivo à leitura) e o gerente executivo do trabalho, Maurício Garcia (Ibope Inteligência). Ao apresentar a análise dos dados, Garcia pinçou 22 "retratos", entre os muitos que a pesquisa oferece.
1. A leitura é extremamente valorizada pelos brasileiros - tem valor significativo para três de cada quatro pessoas;
2. Apesar de respeitada, ainda é pouco praticada - apenas um em cada três brasileiros lê com freqüência: a leitura está em quinto lugar - 35% - entre as opções das pessoas para ocupar o tempo livre - a televisão é campeã, com 77% das preferências; e no quesito "freqüência de atividade", fica em 12º lugar - só um terço lê amiúde;
3. No imaginário coletivo, falar que não gosta de ler é politicamente incorreto, mas parcela significativa - 38% - dedica menos de uma hora por semana à leitura;
4. Leitura é sinônimo de conhecimento, mas muito restrita à academia, aos interesses profissionais, e pouco relacionada com o desenvolvimento do indivíduo;
5. Esta foi uma pesquisa de opinião pública, muitas respostas buscam atender o senso comum;
6. Apesar da aura de fonte de conhecimento que conferem à leitura, dois de cada três entrevistados informam não conhecer alguém que tenha vencido na vida graças à leitura;
7. As pessoas dão valor à leitura, mas não têm ninguém no seu círculo com este perfil;
8. A leitura é vista como algo árduo, cansativo, que demanda tempo e ambiente apropriado - 84% clamam por silêncio para ler;
9. No dia-a-dia quem gosta de ler livros é considerado CDF e fora da realidade;
10. As campanhas de leitura devem valorizar o livro e o leitor;
11. O livro é o elemento que representa a leitura - não é o jornal, a revista ou a internet;
12. As bibliotecas são vistas como equipamento para estudante;
13. O papel do poder público é importante neste quadro: o aumento do número de livros lidos é fruto dos sucessivos programas de governos de distribuição das publicações nas escolas, o que promove a democratização do saber;
14. As pessoas querem que o livro chegue em casa;
15. O analfabetismo - total ou funcional - é um fator estrutural que impede a disseminação da leitura;
16. Para mudar é preciso focar no papel da família - 49% informaram que a mãe foi quem mais influenciou na leitura, 30% o pai e 33% o professor;
17. Ainda assim, a maioria não viveu o hábito de pais lendo para os filhos;
18. Livro não está presente no cotidiano das pessoas;
19. Pessoas com mais livros à disposição aumentam o interesse por ler;
20. Uma solução para ampliar a leitura é tornar crianças distribuidoras de livros, que levariam para as famílias;
21. As pessoas não vão às bibliotecas;
22. É preciso intensificar os processos que garantam acesso ao livro.
Em resumo, os indicadores encontrados pela pesquisa foram: Há 95,6 milhões de leitores no país (55% da população com cinco anos ou mais) e 77,1 milhões de não leitores. São comprados 1,2 livros por ano, por habitante, número que cresce para 5,4 livros quando aumenta a renda e a escolaridade do entrevistado. Dos 4,7 livros lidos por ano por brasileiro, 3,4 são os indicados pela escola - seja didáticos, seja literatura - e apenas 1,3 consumidos por desejo próprio. As mulheres lêem mais do que os homens - 5,3 livros contra 4,1 - quando a escolha é individual, mas o desempenho de leitura no período escolar é idêntico.
Pelo que foi apresentado, este grupo de retratos pode ser modificado, reagrupado. Outros dados foram apresentados no Seminário e que também merecem reflexão. A compreensão pode ser mais aprofundada com a leitura da íntegra do material a partir da próxima semana no endereço do Instituto Pró-Livro, entidade responsável pela coordenação geral da pesquisa.
Bíblia campeã
Qual a leitura preferida? Em primeiro lugar estão as revistas, com 52% das preferências, seguidas pelos livros, com 50% e jornais, com 48%. A leitura no meio digital representa apenas 3%. Quanto ao gênero, a bíblia é campeã, com 45% das escolhas, seguidos dos didáticos (obrigatórios) com 34%, romances, com 32% e, com 26%, a poesia, leitura, aliás, preferida pelos jovens na faixa entre 11 e 17 anos. Os autores mais admirados, pela ordem (e apenas os sete primeiros) são Monteiro Lobato, Paulo Coelho, Jorge Amado, Machado de Assis, Vinícius de Moraes, Cecília Meirelles e Carlos Drummond de Andrade.
Quando a questão foi que livro mais gostou, novamente a bíblia foi a mais citada, com dez vezes mais indicações que o segundo colocado Sítio do Picapau Amarelo. Entram nos campeões do gosto dos entrevistados Chapeuzinho Vermelho e Harry Potter. Os clássicos de nossa literatura, muito lembrados, provavelmente pelas leituras obrigatórias no período escolar, também foram citados entre mais de mil títulos. O último livro que leu também traz a bíblia à frente, com 18 vezes mais citações que o segundo, o Código Da Vinci.
Este resultado da preferência de leitura mostra duas influências importantes: a religião e a televisão. No que diz respeito ao primeiro item, ressaltem-se, além de gênero e livro favorito, que a leitura religiosa se mostra na forma de ler - por trechos e capítulos da bíblia, citada por 55% dos leitores - e como motivação para ler - motivo de 26% dos leitores. Os espíritas gostam de ler e o fazem com freqüência - 76%. A influência da TV está estampada na escolha do Sítio do Picapau Amarelo como livro, mas que na verdade é apenas uma escolha reforçada pela representação da obra de Monteiro Lobato, durante décadas seguidas, nas manhãs da telinha.
O peso do livro didático distribuído pelo governo - indiferentemente de partido - foi fundamental no crescimento do índice de leitura anual de livros. Dos 3,9 livros lidos por ano no Norte, 3,7 foram recebidos do governo e 0,2 adquiridos pelo leitor; dos 4,2 no Nordeste, 3,8 vieram do Estado e 0,4 próprios; dos 4,5 no Centro-Oeste, são 3,4 de distribuição e 1,1 próprios; dos 4,9 do Sudeste, 3 e 1,9; dos 5,5 lidos no Sul, 3,7 são governamentais e 1,8 de iniciativa pessoal.
Para quem trabalha com jornais e revistas, dados para reflexão: os primeiros têm elevado índice de leitura diário, 53% em casa e 15% no trabalho; as outras são lidas em casa, 63%, com periodicidade semanal; o que reflete bem o comportamento do mercado editorial destas publicações. O livro, com status de ente superior, tem maior índice de leitura mensal e é lido tanto na escola quanto em casa.
O tempo dedicado à leitura também é curto para um bom universo de leitores: 38% lêem menos de uma hora por semana e 51% entre uma e três horas. Apenas 2% lêem mais de 10 horas semanais. A pesquisa mostrou o que se intuía pelo senso comum: quem tem mais escolaridade dedica-se mais a ler. A novidade é que as crianças até 10 anos também estão neste patamar. Os dados indicaram o interesse infantil pela leitura, impulso que se perde no jovem e retorna quando as pessoas têm mais de 40 anos. E o que leva a pessoa a ler? O tema, para 63%, e o título, para 46%, escolhas mais fortes entre leitores de renda e nível escolar mais elevados. O autor, 33%, é a escolha de quem tem escolaridade mais baixa.
A maioria prefere ler em casa, 86%, e tem na família - mãe, 49%, pai 30% - e na figura do professor - 33% - os principais influenciadores para o hábito de ler. Também conta nesta influência, a visão de pai ou mãe lendo histórias na infância, presente em 60% das entrevistas dos leitores.
Estas informações sobre as crianças devem ter inspirado a proposta dos consultores que analisaram os dados, para que o Estado promova a distribuição de livros para os pais, por intermédio das crianças. Também fica clara a importância da escola neste processo e que a imagem do professor é de orientador e está atrelada ao livro. Também é uma notícia excelente crescimento de leitores interessados até a faixa dos dez anos, é preciso aproveitar este encantamento infantil.
Outro dado interessante encontrado pela pesquisa diz respeito ao empréstimo pessoal de livros, um hábito citado por 45% dos entrevistados. Esta forma de acesso ao livro é maior que por meio das bibliotecas, infelizmente ainda muito vinculadas ao uso para pesquisas escolares, apenas. Vale ressaltar que 20% registram possuir livros distribuídos pelo governo e que as fotocópias de textos também são muito utilizadas.
A pesquisa também procurou informações sobre as barreiras à leitura. Dos entrevistados que não lêem, 53% são homens. No trimestre anterior à pesquisa 45% não haviam lido um livro. Este foi o período - três meses - levado em conta pelo levantamento para considerar a pessoa uma leitora, desses, muitos declaram que lêem devagar, que não compreendem os textos, não têm paciência ou não têm concentração para ler.